Você Não Está Só #5

Capítulo 5 — Centro Espírita

Anteriormente…

Ian decidiu investigar as coisas do irmão recém falecido em busca de alguma pista sobre a suposta mensagem do copo e encontrou uma parte da carta de despedida falando coisas sem sentido a respeito da avó deles que está morta há décadas…

almas tênues caminham no inverno

em uma miríade de sentimentos

“por você eu iria ao Inferno”

mas aceitaria os prazeres violentos?

 

— aceito tudo por você.

Centro Espírita

Capítulo 5 — Centro Espírita

Revisão: Bianca Ribeiro

Levo um susto com a porta do apartamento abrindo de repente. Pressiono os olhos, confuso. As pessoas que tinham acesso a minha casa se foram. Melissa chama meu nome de forma suave, tomando cuidado para não me assustar muito se eu estiver dormindo. Relaxo os ombros, o sorriso toma conta da minha expressão. No meio da tarde, enquanto eu investigava mais as coisas de Bruno e me perdia em lembranças melancólicas, eu percebi como fui audacioso lhe entregando as chaves da minha casa e como isso podia ser interpretado de um modo romântico demais. Pensei que ela não as usaria, devolveria e diria para não confundirmos as coisas. Mas não é o caso. A porta fecha, o molho de chaves sacode ecoando no apartamento e eu chamo seu nome para guiá-la até mim.

— Está tudo bem? — Melissa pergunta parada na porta do quarto, observando os papeis espalhados pelo quarto.

— Estou ótimo — ironizo.

Melissa nubla a expressão. Peço desculpas, pisoteio algumas folhas e paro na frente dela com o rascunho encontrado.

— Eu descobri uma coisa.

— Nas coisas do Bruno?

— Sim. Uma parte da carta dele, mas que acabou não deixando na bancada antes de…

A palavra não sai. Dou de ombros, suspiro e entrego a folha para ela. Melissa passa os olhos pelo conteúdo, as sobrancelhas ficam franzidas até que toda sua expressão se transforma em terror.

— Como na mensagem do copo?

— Sim, como aquela maldita mensagem.

Senta-se na cama, pasma. Seus olhos vacilam pelo espaço, as peças vão se conectando em sua mente até desenhar um mosaico.

— Você foi ao médico, Ian?

— Sim…

Essa é sua preocupação?

Admito que esperava um pouco mais de ânimo da parte dela. Por mais que eu não considere que as duas coisas tenham mesmo uma conexão, devida todas as demais explicações razoáveis, achei que ela abraçaria a ideia do sobrenatural como uma comprovação de sua crença. Pensei que veria um sorriso, uma piadinha sobre estar certa, qualquer coisa que a deixasse com aquela expressão adorável de alegria que só ela tem.

— Pronto para ir ao centro espírita?

— Você ainda acha necessário? — indago, confuso.

— Muito mais do que antes, na verdade.

Melissa se levanta e isso nos deixa próximos demais. A seriedade em seu rosto não a torna menos bonita, ainda mais com essa pouca maquiagem que serve apenas para realçar um pouco mais os olhos. Tenho certeza de que se eu tentar sustentar o olhar meu coração parará. Desvio a atenção para uma pilha de papéis, falo que preciso me trocar antes de sairmos. Ela fala que me esperará na sala e me deixa sozinho no quarto frio.

Assisto seus passos até ela sumir no corredor. Solto todo ar contido pelo medo de demonstrar demais. Solto os papeis que tinha em mãos em cima da cama de Bruno. Quando dou as costas para o cômodo, uma lufada de ar bate em minhas costas com um sussurro ininteligível. Olho para trás por cima do ombro. O quarto continua vazio. É claro que continua. Fecho a porta com um sorriso amarelo e vou me vestir no meu quarto.

Saímos de casa poucos minutos depois, os dois com moletons, jeans e tênis All Stars. Descemos as escadas em silêncio. Melissa está muito, muito séria. Abre a porta do prédio com a chave que lhe dei. O frio do anoitecer faz minhas bochechas resfriarem; e é muito diferente da sensação que tenho quando encontro o Chapeleiro.

O centro espírita fica a poucos minutos da minha casa seguindo pela avenida principal. Durante a caminhada ela me conta como foi na faculdade, reclamando um pouco de uma professora conhecida por ser péssima. Escuto todo seu desabafo com atenção, mas não sem deixar de sentir que estamos sendo observados em cada esquina. Às vezes ela me olha diretamente e posso esquecer por um instante sobre essas preocupações. Seus cabelos rosados sacodem um pouco com o andar rápido e diminuo os meus porque sei que ela está me acompanhando e não o oposto.

Chegamos na frente do centro espírita e paramos atrás de algumas senhoras que formam uma longa fila. A casa tem três andares, sendo um deles mergulhando no chão, pois na rua seguinte o arroio obrigou a elevação das avenidas. Para chegar na porta é necessário atravessar uma ponte separando a calçada da construção. Eu nunca vi este ponto movimentado por algo que não fossem moradores de rua, pois a casa tem costume de fornecer marmitas a eles, além de café da manhã todos os dias.

— Vai demorar muito?

— Chegamos cedo exatamente para não pegar muita gente na frente. Acredite, a fila ainda está pequena. As noites de passe são muito requisitadas. Muitas dessas pessoas vêm de bairros distantes, até de cidades vizinhas.

— Eu não fazia ideia disso.

— E nem teria como, não é?

Concordo, mas algo dentro de mim se revolta. Quero fazê-la se sentir confortável comigo até nas coisas mais íntimas, então por que nunca tive interesse em buscar mais sobre essa parte dela? Baixo os olhos encarando a barriga dela coberta por um moletom do Studio Ghibli. As cicatrizes naquela região também são um mistério para mim, será que eu deveria falar a respeito?

Deixo a ideia de lado e presto atenção nas pessoas da fila. Nem todas são idosas como achei na primeira impressão. Muitas devem estar na faixa dos trinta anos. Algumas crianças acompanham seus responsáveis e não parecem estar incomodadas com aquilo. Parecem mais acostumadas. Abro um sorriso lembrando da minha própria infância quando minha mãe me arrastava para a igreja. Eu nunca gostei do ambiente, sempre havia um desconforto no ar, uma pressão vinda de todos os lados, um frio. Bastaram algumas tentativas que resultaram em lágrimas e berros para ela desistir da ideia.

Vejo um homem em pé na frente da porta do centro espírita. Cabelos ralos, boa postura e roupas brancas da cabeça aos pés. Observa a multidão, mantendo as mãos entrelaçadas na frente do corpo, um sorriso sereno. Ninguém se incomoda com sua presença. Ele me encara de longe, aperta os olhos e expande o sorriso. Sinto um calafrio passando pelos braços, o frio da assombração me assola, porém, não o encontro em canto algum. Volto a encarar o homem de branco, mas ele não está mais na porta ou em qualquer outro lugar. A única coisa que sobrou no seu lugar é uma mancha branca que se dissolve como névoa.

— Preciso fazer alguma coisa quando entrar?

— Só me seguir.

Eu te seguiria até o inferno, assinto olhando nos olhos dela.

Ficamos assim por mais tempo do que o normal. Melissa sorri sem parar de me encarar. Meu coração erra uma batida com sua beleza. Desvio o rosto, dizem que é perigoso encarar o sol por tempo demais.

As pessoas continuam chegando e se enfileirando. Nossa conversa fiada passa a se misturar às vozes das outras pessoas. Crianças brincam entre as pessoas na fila aos berros de seus responsáveis porque estamos numa calçada apertada em uma avenida movimentada. Observo dois meninos em particular. A voz de Melissa se distancia um pouco, e acabo sorrindo com as memórias transbordando diante dos meus olhos.

— No que está pensando? — Melissa questiona, apertando os olhos.

— Eu adoraria acreditar nas mesmas coisas que você.

— Por que isso de repente?

— Talvez seja mais fácil encarar certas coisas com a crença de que existirá um depois.

Melissa dobra as sobrancelhas numa expressão triste. Eu não queria colocar um peso sobre ela, mas vendo essas crianças, essas pessoas mais velhas que com certeza conhecem a dor da partida repentina, eu não consigo evitar a inveja. Elas não precisam se contentar com a verdade de que o fim é apenas o desligamento de nossas funções corporais seguida da derradeira decomposição. As pessoas nesta fila acreditam que realmente exista alguma coisa depois.

— Não é tão fácil quanto parece… — fala com fragilidade.

Desvia o rosto para o céu e neste momento tenho a impressão de que as palavras erradas podem acabar quebrando alguma coisa dentro dela; então fico calado.

Após alguns minutos as portas do centro espírita são abertas. Um homem branco na faixa dos quarenta anos com roupas neutras e cabelos ralos surge cumprimentando as pessoas na fila e as convidando para entrar. Ele mantém uma expressão neutra, mas quando chega a nossa vez um sorriso estranho brota em seu rosto. Melissa agradece chamando-o de “Seu Carlos” e então entramos no salão principal do centro espírita. Meus ombros ficam tensos e um arrepio percorre minha espinha.

O interior é com paredes de concreto e chão de madeira que faz um barulho engraçado a cada passo. Há várias salas fechadas com placas nas portas escrito “CONSULTORIA” e “SALA DE ESTUDOS”. Há roupas penduradas em araras com um valor fixo de dez reais por peça — e algumas pessoas estão conferindo o vestuário. Acessamos uma sala extensa com diversas cadeiras de madeira desconfortáveis de frente para enormes portas-duplas com a placa “PASSE ESPIRITUAL”.

A fila volta a se formar para colocar os nomes em uma lista do dia. Depois que colocamos nossos nomes é que nos sentamos com os demais visitantes.

Um frio estranho permeia minhas canelas, um desconforto cresce como mofo se espalhando. Parece com a sensação de estar em um hospital. Melissa não parece sentir esse tipo de coisa, pois está sentada com uma expressão tranquila. Meus olhos são levados ao homem de branco parado na porta, que divide esta sala da entrada da casa. Ele me encara com aquele sorriso estranhamente pacífico e faz meu corpo inteiro estremecer. Ao redor dele existe uma camada pálida, translúcida e muito semelhante àquela névoa. Ninguém parece notá-lo, pelo menos não fazem sequer uma menção a cumprimentá-lo.

Por mais estranho que isso seja, prefiro não falar nada. Na igreja que minha mãe ia, havia algumas pessoas pelos cantos que também eram silenciosas e a maioria passava batido.

Melissa toma uma de minhas mãos, entrelaçando nossos dedos. Pressiona com gentileza e não diz nada. Finjo costume, mas meu coração acelera como se eu não estivesse a três meses de fazer vinte e três anos…, bom, isso se os padrões trágicos da família não se repetirem comigo.

Solto a mão dela em reflexo ao pensamento, pois não quero magoá-la. Sei que isso é inevitável por termos criado uma amizade tão bonita, mas acho que posso diminuir o impacto se não permitir que nada mais se forme entre nós. Sendo um problema espiritual ou mental, há muito mais do que tragédia correndo em minhas veias. Tenho medo de me tornar alguém cuja convivência é apenas um martírio e não uma experiência positiva.

Entrelaço as mãos para que ela não volte a pegá-las.

— Com licença. Olá. Com licença…

Viro a cabeça para uma mulher de meia-idade com longos cabelos cacheados e armados com linhas grisalhas. Ela passa pelos assentos, mostrando um sorriso simpático aos visitantes. Após muitos apertos de mão, acenos com a cabeça e feições gentis, ela para na nossa frente e me encara calada durante alguns segundos.

— Muito prazer, meu nome é Camila, posso conversar com você um minutinho?

Peço a ajuda de Melissa com um olhar assustado, em silêncio. Melissa coloca a mão sobre as minhas, inclina-se para frente com um sorriso simpático e chama atenção de Camila.

— Dona Camila, esse é o Ian, mas ele só veio conhecer o espaço, não vamos começar com os convites — fala como se aquilo fosse rotineiro.

— Eu não trago convites, Melissa. Na verdade… — Camila passa os olhos ao redor. Faço o mesmo, as pessoas estão tentando escutar a conversa. Camila se abaixa e esconde os lábios fazendo uma concha com a mão. Próxima dos nossos rostos, ela sussurra: — É sobre as coisas que você tem visto, Ian.

Meus olhos quase saltam do rosto. Como ela sabe? Encaro Melissa procurando algum sinal de que ela tenha contado, mas a encontro tão apavorada quanto. Eu não consigo evitar a curiosidade. Seria ela apenas uma impostora jogando verde? Será que existe mesmo alguma coisa fora da curva dessa realidade insossa que tenho vivido nos últimos seis meses?

— Melissa pode vir comigo?

— Claro, se isso te deixar mais confortável.

Sim, ela me deixa, penso e guardo isso comigo. 

Melissa está confusa. Como não estaria? Em outros momentos eu apenas declinaria a oferta por não acreditar nessas coisas. Ela só não entende que preciso ter certeza de sua segurança, mesmo que isso signifique aceitar a possibilidade de um mundo espiritual se atravessando ao real.

Camila nos faz retornar a entrada. Só agora percebo que o homem de branco não está mais aqui. Ela abre uma porta cuja placa acima dela diz “REUNIÃO MEDIÚNICA”. Aperto os olhos sem entender o que significa. Assim que entramos, vejo o homem de branco no fundo da sala, dedos entrelaçados na frente do corpo e o sorriso suave no rosto.

— Seja bem-vindo, Ian. A casa fica muito feliz com sua presença. Diga-me, por que você realmente está aqui?

Troco um olhar rápido com Melissa.

— Para receber um passe? Melissa disse que poderia ser bom.

— E por que, Melissa, você acha isso?

— Fizemos uma brincadeira idiota ontem à noite. Eu sei que vocês me falaram para não fazer isso desde aquilo, mas ele é tão descrente que eu precisava tentar alguma coisa.

Sinto-me uma criança no meio de dois adultos conversando.

— Você sabe que não vai conseguir se comunicar com quem ama assim. Melissa, o que aconteceu desta vez?

Melissa pega minha mão enfaixada e a levanta no ar. A mulher suspira na nossa frente, dá as costas e caminha até um armário com livros. Pega um, coloca-o na mesa e abre. Percebo agora que não é um livro qualquer, mas uma versão da Bíblia.

— Ian, você tem visto coisas, não é?

— Só em meus pesadelos — minto de braços cruzados.

Ela não vai me fazer cair nessa conversa ambígua. Conheci pastores o suficiente para saber como o próximo passo será me cobrar um valor absurdo.

— Quantas pessoas estão nessa sala?

A pergunta dela me faz apertar os olhos e sacudir a cabeça.

— Quatro.

— Como assim, Ian?! — Melissa me puxa pelo braço com os olhos arregalados.

Fico sem compreender a reação exagerada dela. Somos quatro, contando com aquele homem de branco no fundo da sala. Será que existe alguma regra de castas dentro do espiritismo que faça ele ser um “intocável” ou coisa parecida? Se for esse o caso, ela esqueceu de me avisar.

— Você, eu, ela e ele.

— Ele quem, Ian? — Melissa pergunta isso de forma muito, muito séria.

Aponto na direção do homem de branco. Melissa encara o homem, vira para mim e dá dois passos para trás. Camila começa a folhear a Bíblia atrás de alguma passagem específica.

— Você está apontando para o meu mentor.

— E o que tem de surpreendente nisso?

— Mentores são espíritos, Ian.

Volto a encarar o homem no fundo da sala com tanta clareza quanto posso ver as outras duas pessoas na sala, exceto pela camada translúcida e quase invisível de palidez que flutua ao seu redor como poeira quando o sol reflete nela. Minhas sobrancelhas apertam tanto que chegam a doer. Fico com um sorriso estúpido no rosto. Penso em quem passou pelo mentor ignorando sua existência e solto uma risadinha debochada. Elas não estavam ignorando-o, apenas não podiam vê-lo.

— Isso não faz sentido. Embora seja normal esse tipo de coisas em ambientes religiosos, eu precisaria ter alguma crença para meu cérebro simplesmente virar uma chave e começar a me mostrar fantasmas.

— Espírito. Fantasmas são outra coisa.

Camila fala aquilo tanta seriedade que me força a procurar as câmeras ao nosso redor. Melissa está pasma demais para falar alguma coisa, então apenas aceito que exista uma diferença entre essas coisas.

— Eu não acredito nessas coisas.

— Você não precisa acreditar para que seja verdade — Camila para de folhear a Bíblia e me encara com as mãos na mesa. — Nunca teve uma experiência sobrenatural antes? Talvez na infância.

— Não. Nada inexplicável.

— Ele é realmente cético — Melissa bufa.

Camila lança um olhar cansado para Melissa.

— Percebi.

— Mas ele não faz isso por mal — Melissa conclui.

— Eu ainda estou na sala… ou virei um espírito?

Melissa abre um sorriso tímido. Eu me esforço para fazer o mesmo, entretanto, a única coisa que passa na minha cabeça é o rosto dela antes de mergulhar na escuridão. Pode ter sido apenas um pesadelo, fruto de um inconsciente marcado por tragédias que teme perder mais uma pessoa importante, porém, neste momento, tudo parece real demais. Eu não quero perder mais uma pessoa importante. Não suportaria vê-la em uma cama de madeira como vi meu irmão há poucos dias. O mero pensamento arranca o ar em meus pulmões e me faz puxar uma cadeira para sentar.

— Digamos que eu esteja vendo coisas. — Falo me forçando a não rir de nervosismo. — Como isso é possível? Por que eu?

— Você nunca viu nada na infância? — Camila insiste.

— Talvez uma vez aos sete anos…, mas foi fruto de terror noturno.

— Esse é apenas outro nome para assombração — a espírita explica.

Solto um risinho anasalado. As pessoas falavam isso há centenas de anos, mas hoje em dia existem explicações científicas e plausíveis. Ainda assim, prefiro dar corda ao assunto. Algo dentro de mim não quer apenas descartar tudo isso sem ter certeza de que é tudo mentira.

Camila indica o assento para Melissa e se senta na frente do livro sagrado.

— Você sempre teve sensibilidade espiritual, mas se manteve afastado dela por muitos anos.

— Por que isso mudou agora? — questiono.

— Porque você passou por muitos traumas — Melissa é quem responde com a mão sobre o estômago.

— Ficar de frente para a morte nos provoca um despertar — concorda Camila.

Morte. Uma palavra pequena, de apenas cinco letras, mas que faz todo meu corpo paralisar. Cenas embaralhadas voltam à consciência como uma tempestade de lembranças; os corredores de hospital, os gritos de dor, o sangue, a palidez, a corda, os paramédicos, as camas de madeira…

— Você queria conversar comigo sobre o quê?

— Assim como você enxerga meu mentor, eu posso ver o que está andando contigo. Gostaria de fazer uma limpeza espiritual e mandá-lo embora, caso você aceite.

— Quanto isso vai custar?

— Ian, para com isso! Desculpa, Dona Camila, ele não sabe como funciona a casa…

Camila a interrompe erguendo a mão.

— Está tudo bem, de verdade. Ian, eu não vou cobrar nada. Apenas gostaria de lhe ajudar a se livrar desse obsessor.

— Certo. E como ele é?

Cruzo os braços com um sorriso desafiador. Lembro-me de quando uma pessoa fez isso com um pastor na igreja que minha mãe ia e ele não teve como responder. Será a mesma coisa agora e assim terei certeza de que não existe nada de sobrenatural nessa história toda, apenas uma pessoa traumatizada e uma família azarada. Com isso poderei voltar para casa e viver como sempre vivi.

— Um homem alto de casaco-sobretudo preto e chapéu-coco.

Perco a compostura, o sorriso se esvai e minhas sobrancelhas ficam apertadas. Coloco os cotovelos na mesa, encaro a mulher do outro lado da mesa da forma mais séria possível.

— Quando podemos fazer essa limpeza?

— Agora mesmo.

Seguro a mão de Melissa que agora está sentada ao meu lado e assinto em silêncio.

— Vai ficar tudo bem, Ian — Camila fala.

Volto a concordar em silêncio, mas o frio na sala diz o contrário.

Comentário do Autor

A partir deste ponto vale tudo. Essa foi a minha regra ao escrever a história, mas, confesso, na primeira versão me contive muito. Queria escrever algo mais comercial, então fui cheio de dedos. No entanto, após a leitura beta de um time incrível, compreendi que era mais importante deixar as asas abertas e me permitir criar a história como ela estava na minha cabeça. Com as maluquices sobrenaturais, fantásticas e estranhas que gosto. Graças a essas pessoas eu pude me libertar um pouco mais das correntes e escrever o que se tornou essa história.

Esse exercício, porém, é difícil. Às vezes ficamos tão presos ao que os outros vão querer ler que esquecemos que, acima disso, devemos escrever o que nós iríamos ler. Tudo o que publiquei até hoje foi assim, mas não quer dizer que foi mais fácil de tirar da cabeça. Será que isso não vai ficar subjetivo demais? Será que isso vai parecer fazer sentido? Será que isso é divertido para alguém? Esses pensamentos que se acumulam, no fim do dia, não serve de nada no momento de criar. Talvez sirva para ajustar detalhes na edição e só. Talvez.

Você Não Está Só, porém, não merecia ficar preso a essas perguntas. Obrigado, betas fantasmas, vocês me ajudaram demais com esse problema.

Agora, por favor, aproveite a jornada sobrenatural, fantástica, romântica e, às vezes, assustadora.

Gogun.